Categorias
Análise do Comportamento terapia baseada em processos

Terapia Baseada em Processos e o Retorno ao Tratamento Individualizado

por

Denis Zamignani /Fernanda Calixto / Pedro Quaresma

Um novo paradigma em psicologia clínica parece estar surgindo. A proposta de uma Terapia Baseada em Processos (TBP) questiona o modelo anterior da terapia baseada em evidências por se apoiar no modelo de doença médica com protocolos de terapia específicos vinculados a síndromes descritas nos manuais psiquiátricos.

Trata-se de uma nova geração de cuidados terapêuticos baseados em evidências, voltada para a intervenção  sobre processos comportamentais transdiagnósticos (Hayes & Hofmann, 2018). A ênfase nesses processos transdiagnósticos representa uma mudança no desenvolvimento dos estudos de efetividade em psicoterapia, em que os processos (tais como esquiva experiencial, regulação emocional ou Flexibilidade Psicológica) ganham mais relevância no tratamento que os procedimentos (Mindfulness, exposição com prevenção de respostas, dessensibilização). 

Autores que têm defendido o modelo de TBP apontam que muitos dos manuais de intervenção para diferentes transtornos psiquiátricos descrevem basicamente os mesmos processos comportamentais na especificação de seus sintomas. Adicionalmente, defendem que a queixa clínica de um indivíduo nem sempre se encontra representada unicamente pelo conjunto de sintomas descritos nos transtornos. Para cada indivíduo existe uma possibilidade de combinação infinita de processos comportamentais envolvidos nas suas demandas terapêuticas. 

No modelo de TBP há um retorno à ênfase no tratamento altamente individualizado e criativo por parte do terapeuta. Bem como, quando nos referimos à analistas do comportamento, do retorno da presença da análise de contingências como base do trabalho do clínico. Assim, há um retorno ao papel central da análise específica de cada caso clínico conduzida pelo terapeuta na mudança nas vidas dos seus clientes. 

Hofmann, Stefan G., & Hayes, Steven C.. (2018). TCC Moderna CBT: movendo-se em direção a terapias baseadas em processos. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, 14(2), 77-84. https://dx.doi.org/10.5935/1808-5687.20180012

Categorias
Sem categoria

COMO FAÇO PARA DEIXAR DE SENTIR?

por Bruna Catarina Pavani

No último texto sobre Frustração, comentei que falaria sobre como aceitar melhor o que sentimos e é sobre isso que vamos falar hoje.

Diante do número crescente de mortes, a COVID-19 tem causado outra pandemia: a do medo e ansiedade. A COVID-19 mudou a forma como nos comportamos, como nos relacionamos, como fazemos planos.

De início imaginamos que seriam apenas 15 dias em casa e estes 15 dias viraram 1 ano. E de que forma isso nos afeta?

Nos tornamos pessoas mais ansiosas, menos tolerantes a frustrações, mais estressadas, com dificuldades para dormir, com alterações no apetite etc.

Ignorar o que sentimos só piora a situação. A melhor forma de lidar com isso é nos acolhendo. Mas será que dá para fazer isso?

Crescemos em uma sociedade onde ficar triste, magoado, com raiva, irritado é visto como algo ruim. Quando isso acontece, logo vem alguém dizer: ‘’mas a sua vida é tão boa e você está aí triste’’, invalidando seus sentimentos. Nomeamos isso de: positividade tóxica, mas pera aí, alguém aqui consegue controlar o que sente?

Se eu falar para vocês:

 ‘Não pensem em um bolo de chocolate com recheio de prestígio’

Provavelmente, a primeira coisa que vocês pensaram, foi num bolo de chocolate com recheio de prestígio e por que vocês não controlaram isso? Porque simplesmente não dá, simplesmente não depende apenas de você. E é a mesma coisa dos sentimentos…

Hayes e Pistorello (2015) dizem:

‘’Tendemos a formular regra de não pensar (ou sentir, ou lembrar) no evento aversivo, mas na própria regra: “não vou pensar em x”; o “x” está presente e transformará a aversividade do evento para a palavra, tornando aquilo que se quer evitar, presente. E por esta razão que o controle dos eventos encobertos não funciona efetivamente, pois não se trata de uma pedra que se esconde num lugar distante e não se vê mais; o comportamento verbal faz da simples pedra aquela que sempre volta no meio do caminho.’’ (p.24)

Somos ensinados e tentar evitar tudo o que é considerado negativo: pensamentos ou sentimentos. E eu concordo que é desgostoso sentir raiva, tristeza, angústia, frustração etc., porém, esses sentimentos também são importantes e precisamos avaliar em que situações estamos nos sentindo assim…

Hayles e Pistorello (2015) mencionam dois motivos pelos quais as pessoas tentam ter controle sobre os comportamentos encobertos:

  • Eles costumam funcionar bem nos eventos abertos
  • O controle funciona a curto prazo, gerando assim, um reforço negativo significativo.

Ou seja, nossa própria cultura nos ensina que, se ignorarmos o que estamos sentindo, uma hora passa, mas a verdade é que não passa.

Quando você passa aceitar que está tudo bem se sentir dessa forma, porque condiz com a situação, você percebe que da mesma forma que o sentimento vem, ele vai embora… Quanto mais você tenta lutar para não se sentir de determinada forma, mais você vai se sentir.

Uma dica que dou é: Converse com teus sentimentos, avalie o porquê você está se sentindo dessa forma (avalie os antecedentes), perceba se esse sentimento condiz com a situação e diga para si mesmo ‘está tudo bem eu me sentir dessa forma, eu sei que logo vai passar’.

Hayes, S.C. e Pistorello, J. (2015). Introdução a Terapia de Aceitação e Compromisso. Belo Horizonte/MG: Artesã.

Bruna Catarina Pavani – @psicobrupavani

Especialista em Análise do comportamento (ITCR) | Pós graduanda em Sexologia (INPASEX)
CRP 06/135021

Categorias
Sem categoria

Psicólogo: O que você faz para evitar a solidão profissional?

Autor: Comunidade DíadeLab*

Muitos terapeutas encaram a profissão como uma jornada muito solitária. Para estes, boa parte do dia a dia é focada na relação profissional, paciente/cliente e na jornada de atendimentos, com pouca oportunidade de interações sociais fora desse contexto. Isso parece algo comum ao seu cotidiano? Pois saiba que realizamos uma enquete entre psicólogos e, 79% dos 34 respondentes se dizem solitários na profissão (parece bastante, você não acha?). 

Às vezes faz muita falta uma rede de apoio! Precisamos falar sobre nossos casos, discutir, desabafar e ter supervisão mesmo que informal entre colegas. E, para evitar a solidão no dia a dia de trabalho, é necessário buscar contato com os pares ativamente. Seja por meio de grupos de estudos ou interagindo nas redes sociais, o importante é criar oportunidades de interação. Fazer psicoterapia, supervisão ou intervisão também está entre as boas estratégias de interação social, assim como compartilhar as angústias sobre o tema com outros profissionais.

Segundo os membros da comunidade que responderam à nossa enquete, outra forma de driblar a solidão é participar de eventos, acompanhar lives e outros recursos disponíveis na rede, além de cursos e atividades nas quais possa  interagir com alunos e professores – durante e após os encontros. Não podemos esquecer também das sugestões de prática de atividade física e de, sempre que der certo, sair para tomar um café com um amigo entre um atendimento e outro.

Especialmente nesse período de Pandemia, em que fomos privados de contato com boa parte de nossa rede de apoio, o auto-cuidado e a criação de uma rotina enriquecida podem ser essenciais para preservar nossa saúde mental. Nesse vídeo, Denis Zamignani analisa as contingências às quais nós, terapeutas, estamos submetidos e propõe algumas estratégias para auto-cuidado. Não à toa, o título é “Sabe lá o que é não ter e ter que ter para dar”.  

Se você está entre os que se sentem desacompanhados, teça, entrelace, desenvolva sua rede de apoio junto com a gente. A Díade|Lab é uma comunidade digital de analistas do comportamento. Sua contribuição pode tornar essa comunidade uma fonte cada vez mais rica de interações acolhedoras e reforçadoras. Conte pra gente o que você espera de uma comunidade de analistas do comportamento e de terapeutas. Dê sugestões, proponha atividades, organize grupos de estudo e a gente vai fazer o possível para fazer a sua ideia se transformar em realidade. Vamos fazer isso juntos?

*Esse texto foi escrito coletivamente pelos membros da DíadeLab com a compilação das respostas à enquete do movimento ‘Solidão Profissional’ no Instagram da @diadelab

Categorias
adolescência Análise do Comportamento Clínica

Limites (e sugestões) para orientação de pais em atendimentos com adolescentes

Gessika N. Gimenez Hilgemberg

Sabemos que em um processo terapêutico infantil sob perspectiva da Análise do Comportamento, a participação dos pais é de extrema importância. Muitos autores salientam inclusive que psicoterapia infantil sem a participação dos pais é inviável (para não falarmos que é impossível).

Mas e quanto a participação dos pais em um processo que envolve os adolescentes? Quais são os limites? Até qual ponto a participação deles pode ser eficiente ou até atrapalhar? Quando começamos a olhar para este aspecto, nos deparamos com um ponto crucial: a relação terapêutica.

Os adolescentes são conhecidos (de forma muitas vezes generalista e até equivocada) como um público desconfiado, inseguro e que preza pela sua privacidade. Só por aí já temos informações (sejam elas verídicas ou não) de como precisará se dar a relação com estes clientes. Para aqueles que topam e se engajam no processo, eles muitas vezes esperam que o terapeuta seja a pessoa acolhedora, empática e não punitiva diante de seus relatos de aventuras e sofrimentos vividos. Esperam que o terapeuta “entre” em suas descobertas e que a terapia possa ser um lugar seguro e que nada do que ele falar seja criticado ou exposto – principalmente para os pais.

Mas em determinados momentos, orientação aos pais é por vezes importante. Imagine um cliente de 17 anos que apresenta padrão comportamental de ansiedade social e dependência de outros, que está engajado para mudanças e enfrentamentos, e já trabalhou estratégias de ansiedade em terapia. Ele reside a poucas quadras do consultório do terapeuta, mas os pais ainda o trazem para as sessões. Entraria, em algum momento da terapia, a estimulação e encorajamento por parte do terapeuta para que aquele cliente experimentasse caminhar até o consultório por alguns metros, sozinho. E aí caberia uma conversa de orientação ao pais para que estimulassem este cliente também a vir sozinho e fazer esse enfrentamento rumo a melhora. Mas neste momento, todo o cuidado é necessário para que não seja quebrado o vínculo com o adolescente, onde ele é seu cliente e você deve seu sigilo.

Para isto, tomo alguns cuidados neste processo. Estes claro, modelados pelo acerto e erro na prática clínica, supervisões e literatura. São alguns deles:

  • Sempre que for necessário chamar os pais, comunico de antemão ao meu cliente pedindo sua autorização. Explico qual meu objetivo ao trazer os pais para o consultório, muitas vezes faço a análise funcional do porque seria importante ter essa conversa com eles e garanto o meu sigilo a ele. Dificilmente converso com os pais sem antes ter este aval por parte do cliente.
  • Tomo o cuidado de na sessão seguinte a conversa com os pais, trazer para meu cliente os pontos importantes que foram discutidos. Isso auxilia para que o cliente não entre em ansiedade em querer saber o que foi conversado ou que não crie fantasias de que o terapeuta e seus pais possam ter criado uma aliança contra o cliente, por exemplo. Isto claro, de acordo com o interesse do cliente. Alguns não estão interessados em saber (pode ser aversivo) e aí informo apenas aquilo que é relevante para o trabalharmos o caso ou relevante para o cliente.
  • Outro cuidado que considero ser importante é que na grande maioria das vezes opto por fazer a orientação aos pais sem a presença do cliente. Isso pois muitas vezes eles consideram ser muito aversivo estar ali, com os pais, onde muitas vezes estes podem criticar ou julgar algum comportamento do filho. Provavelmente terminará em um “climão”, onde o objetivo daquele encontro sai de orientação aos pais e caminha para terapia familiar. Mas claro, existem as excessões. Se a análise funcional mostra que será mais importante para o vinculo com você, ou que aquele cliente quer participar para esclarecer juntamente de ti alguns pontos, é muito válido incluir. Desde que ele tenha o interesse e a análise do caso mostre que aquilo será benéfico para seu cliente.
  • Existe também outras duas possibilidades que encontro na clínica: quando o cliente não quer que o terapeuta faça essa conversa ou quando envolve comportamento de risco. No caso da primeira, explico todas as consequências favoráveis para que eu realize aquele encontro, protejo nossa relação falando sobre o sigilo, mas tem vezes que não tem como. O cliente não está disposto. Neste caso, escolho por acolher e mostrar compreensão. Tento compreender seus motivos, converso sobre eles e informo inclusive que aguardo e que não agendarei minha conversa com os pais sem sua autorização. Mas é comum que eu avise que em algum momento isto precisará ser feito, podendo não ser na próxima semana, mas talvez na outra ou em algum outro momento. E junto disto, avalio sempre a função para que aquele cliente não autorizasse essa minha reunião com os pais.
  • Um segundo caso que muitas vezes elicia respondentes em nós terapeutas é quando o cliente está emitindo comportamentos de risco a si ou a outros e precisaremos comunicar os pais. Nesses casos, mostro ao cliente as consequências daquele comportamento e as consequências que eu enquanto terapeuta estarei correndo também caso não avise aos responsáveis. Em geral, o cliente costuma aceitar que este contato seja feito, mas para aqueles que não aceitam, mesmo assim é de extrema importância que seja comunicado o que está ocorrendo para algum de seus responsáveis e com isto a quebra do sigilo aconteça (e a importância de sempre registrar em prontuário ou documentação este contato que foi feito). Entramos aqui em uma questão inclusive ética, onde temos em nosso código, no Artigo 27°, que a quebra do sigilo profissional está prevista para casos onde o (a) paciente encontra-se em risco ou oferece risco a terceiros, sendo considerado a falta desta comunicação como um comportamento anti-ético.

Claro, estas são algumas diretrizes que eu enquanto terapeuta sigo com base no repertório que fui desenvolvendo ao longo dos anos, mas saliento que a peça chave para a tomada de qualquer uma destas decisões acima, ou qualquer outra, esteja embasada na sua análise funcional do caso.

Referências:

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Código de Ética Profissional dos Psicólogos, Resolução n.º 10/05, 2005.

EMIDIO, L. A. S.; RIBEIRO, M. R. & DE-FARIAS, A. K. C. R. Terapia infantil e treino de pais em um caso de agressividade. Rev. Bras. de Ter. Comp. Cogn., Campinas-SP, 2009, Vol. XI, no 2, 366-385.

MARINHO, M. L. A intervenção clínica comportamental com famílias. Em: SILVARES (org.). Estudos de caso em psicologia clínica comportamental infantil. Volume 1. Campinas, SP:Papirus, 2000.

Gessika N. Gimenez Hilgemberg

CRP: 08/19706