Quando acabamos de sair de um relacionamento amoroso, precisamos lidar com o luto do término, independente se é um relacionamento saudável ou não.
Descrevendo o término de uma forma comportamental: é quando deixamos de entrar em contato com reforçadores que o outro nos fornecia e começamos entrar em contato com sentimentos aversivos como raiva, baixa autoestima, saudade, tristeza, solidão, que são consequências do próprio término.
É como dar um doce a uma criança e depois de um tempo tirar esse doce e falar para essa criança lidar com isso.
Você já conheceu a parte boa de uma relação, agora ter que conhecer a parte desagradável, e para algumas pessoas, é aversivo demais, ao ponto de se esquivarem de futuras relações. E com isso, começamos com um novo conceito: Esquiva.
De acordo com Sidman (1989/2009), esquiva é uma das formas de reforçamento negativo – sendo a outra forma, fuga – onde podemos considerá-la antecipatória, por exemplo: não esperamos levar uma bronca do chefe para corrigirmos algo que já vimos que está errado, nós vamos corrigindo antes mesmo da bronca aparecer, ou, evitamos ficar parados na rua sem gasolina, ao invés disso, quando vemos que está acabando, tendemos a abastecer.
É notório o quanto a esquiva é essencial para a nossa sobrevivência, né?
Porém, uma pessoa que possui um comportamento de esquiva bem refinado, pode ter prejuízos. Sidman (1989/2009) traz algumas desvantagens do comportamento de esquiva:
Empobrecimento do repertório comportamental, já que, o indivíduo não se expõe a contingências para averiguar se passará por uma situação semelhante a anterior.
Contingências de esquiva são coercitivas e se caracterizam pela presença de fortes respostas emocionais como raiva, tensão, medo e ansiedade.
Trazendo isso para o âmbito amoroso e para uma pessoa que possui um comportamento refinado de esquiva, vamos pensar em possíveis prejuízos:
Essa pessoa possivelmente deixará de conhecer novas pessoas com receio de sofrer novamente;
Essa pessoa não irá se expor a eventos sociais, onde tem possibilidade de entrar em contato com novas pessoas;
Essa pessoa deixará de vivenciar bons momentos por receio de vivenciar os momentos desgostosos também
Como psicoterapeutas comportamentais, é importante entendermos o que mantém esse comportamento em nosso cliente e concomitantemente, ir promovendo a aproximações de eventos aversivos de uma forma que o cliente consiga lidar, desenvolvendo assim, habilidades sociais necessárias para lidar com a situação. Sidman, M. (1989/2009). Coerção e suas implicações. Trad. Maria Amália Andery & Tereza Maria Sério. Campinas: Livro Pleno. P.135-176
Bruna Catarina Pavani – @psicobrupavani
Especialista em Análise do comportamento (ITCR) | Pós graduanda em Sexologia (INPASEX) CRP 06/135021
“Não tenho tempo para escrever”. “Todos sabem escrever, menos eu”. “Quando lerem o que escrevi, todos saberão que eu sou uma farsa”. Esses são alguns dos pensamentos compartilhados entre pesquisadores e pesquisadoras, das mais distintas áreas do conhecimento, perante a temida página em branco sempre a lembrá-los daquilo que por mais um dia não fizeram com conforto e satisfação: escrever.
(O Bloqueio da Escrita Acadêmica: caminhos para escrever com conforto e sentido. Robson Cruz, 2020, p. 9)
Eu não sei o quanto de vocês podem achar pertinente um enfoque maior sobre a escrita, mas para mim, escritor acadêmico e literário, demorei bastante para perceber a profundidade daquilo que escolhi como ofício a ser realizado para o restante de minha vida. Foi preciso que o escrever me trouxesse um sofrimento intenso, crises de ansiedade encarando a tela branca do word, tirasse meu sono de frustração, para que eu começasse a encarar como um problema sério e levar para a terapia. Lá, em movimento clínico, percebi que colocar rabiscos em papéis ou ver a projeção de palavras no computador era apenas uma parte de um processo maior e complexo.
Infelizmente, não estou apelando para meu lado exagerado de escritor, ao falar que a escrita está acompanhada de sofrer. Cruz (2018; 2020), Silva (2018) e Skinner (1957) nos alertam para uma série de contingências aversivas associadas ao escrever, em que sentimentos de culpa, tristeza, ansiedade aparecem com mais frequência do que as próprias palavras. A razão primeira é até fácil de imaginar: nós escrevemos para ser julgados, seja por um orientador, editor de revista, leitor ou seguidor no Instagram. Para piorar a nossa situação, observa-se uma baixa fonte de reforçadores, como a falta de prestígio e retorno financeiro. Por exemplo, nos Estados Unidos, somente 21% das pessoas que trabalham com a escrita conseguem viver apenas com a renda obtida pelos direitos autorais (Watson, 2020). E para dar a cereja reluzente sobre o bolo, desde o século XIX muitas noções romantizadas, reproduzidas culturalmente, enfeitam e delineiam padrões inverossímeis com a realidade — o que poderia nos explicar os sentimentos de culpa que aparecem. O pior é que a academia parece não estar tão atenta e engajada para a solução dessas questões (Cruz, 2018; 2020).
Talvez neste momento alguns episódios podem estar vindo à cabeça com desconfortos sentidos ao escrever. E, assim como eu, pode ser que um questionamento também esteja começando a martelar em sua cabeça, como martelou na minha: ok, então o que diabos é a escrita, afinal?
Em meus atendimentos, costumo usar uma metáfora de que a escrita é como um rio. Haverá momentos em que obstáculos aparecerão para impedir o seu fluxo, em outros momentos, afluentes podem fazer com que ele aumente e transborde. É verdade, contudo, que um grande fluxo nem sempre significa algo saudável, já que esse rio pode causar inundações, mas ninguém de fato gosta quando está seco.
Traduzindo para uma linguagem comportamental, a escrita é um comportamento complexo, de parte privada e parte pública, cujas variáveis poderão dificultar ou facilitar a sua frequência. Como todo padrão aprendido, a história individual e cultural, a forma com qual o indivíduo se relacionou com a escrita ou contextos que a envolveram são capazes de afetar num nível de transformar uma atividade simples para uns, algo extremamente penoso para outros. Muitas vezes, esses desconfortos e sofrimentos sentidos são tão intensos que geram um movimento de esquiva acentuado, prejudicando projetos de vida, como observado por Daily e Miller (1975; 1983), em que pessoas com alta taxa de ansiedade envolvida com a escrita, passaram a evitar disciplinas ou cargos profissionais que de alguma maneira trabalhem com produções escritas. A este fenômeno foi dado o nome de “Apprehensive Writer”.
Veja que em nenhum momento está se falando de preguiça, falta de empenho — muito menos falta de um dom! —, mas de uma condição comportamental que, pelo menos desde 1957, em Verbal Behavior, Skinner já nos sinalizava uma potencialidade de sofrimento envolvido. Especialmente a Academia deveria estar preocupada com isso, não somente porque enquanto disciplina científica responsável por tais fenômenos, como, ao meu ver, essa barreira está afetando nossas produções acadêmicas, nossas pesquisas e publicações, tal qual um déficit basilar. Afinal, não é a ciência uma utilização específica da linguagem? (Skinner, 1957) Se precisamos escrever para descrever e estudar nossos objetos de estudos, o que acontece se cientistas não estão escrevendo?
Aos professores e orientadores que estiverem me lendo, quantas vezes vocês não viram uma aluna ou aluno desistir, apesar de evidente o quanto conhecia e o quanto tinha para contribuir? Quantas vezes vocês mesmos não pensaram em desistir por mais que soubesse exatamente o que queria escrever? Quantos cientistas não estamos perdendo?
Então, se escrever pode ser causa para muitos sofrimentos — como em casos de condições intensas, tal qual Apprehensive Writer —, por que não abordamos isso com mais ênfase? O quanto estaríamos preparados, como profissionais, para atender clientes com tais demandas? Será que apenas uma dessensibilização sistemática seria o suficiente para lidar com essas altas taxas de ansiedade em que indivíduos têm mudado sua vida inteira afim de evitar a escrita? E quanto a nós mesmos, escritores, quais práticas que realizamos nos ajudam ou atrapalham?
É com a tentativa de ajudar outros escritores, acadêmicos ou literários, a não passar pelo o que passei, que dou início a esta série de textos sobre o processo comportamental da escrita. Espero ter conseguido sua atenção e curiosidade até aqui, que minhas palavras sobre a própria dificuldade de escrever as palavras, tenham colocado uma pedrinha em nosso sapato analítico-comportamental. Para o próximo encontro, gostaria de lançar uma proposta: tente lembrar das vezes em que tentou escrever e sentiu dificuldades, o que pensava? O que sentia? Qual era o contexto? Estas perguntas podem trazer certas reações emocionais aversivas, então tome seu tempo para revisitar essas memórias. No próximo texto iremos abordar o terrível e famigerado Bloqueio de Escrita, e olhar para nossa história com o escrever poderá ser uma bússola muito útil nessa jornada.
Até lá, fiquem bem e em segurança!
Referências:
Cruz, R. N. (2018). Becker e o silêncio sobre a escrita na pós-graduação: soluções antigas para o cenário Brasileiro atual?. Psicologia & Sociedade, 30.
Cruz, R. N. (2020). O Bloqueio da Escrita Acadêmica: caminhos para escrever com conforto e sentido. Belo Horizonte: Artesã.
Daly, J. A., & Miller, M. D. (1975). The empirical development of an instrument to measure writing apprehension. Research in the Teaching of English, 9(3), 242-249.
Daly, J. A., & Wilson, D. A. (1983). Writing apprehension, self-esteem, and personality. Research in the Teaching of English, 327-341.
Watson, A. (2020, April 24). Number of writers and authors in the United States from 2011 to 2019. Statista.
Silvia, P. J. (2018). How to write a lot: A practical guide to productive academic writing. American Psychological Association. Skinner, B. F. (1957). Verbal behavior. New York: Appleton-Century- Crofts.
Jacinto Junior – Psicólogo formado pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR – 2020). Escritor de Literatura e Co-Fundador do coletivo de Escritoras e Escritores Nordestinos: Oxe LGBT NE. Atua com processos clínicos e com atendimentos focados para a escrita.
A pandemia nos trouxe repentinamente muitas mudanças nas nossas vidas pessoais e nos atendimentos aos nossos clientes. Pessoas perderam emprego, entes queridos, qualidade de vida etc. Relacionamentos que antes podiam funcionar razoavelmente bem porque os dois indivíduos estavam envolvidos no mundo de maneiras diferentes, ou que em sua rotina mal se viam, de repente se depararam com uma realidade na qual passaram a compartilhar o mesmo espaço físico o tempo todo (às vezes em casas com apenas um cômodo). Não sei vocês, mas eu tive um aumento significativo na procura por atendimento de casais e imagino que os senhores do outro lado também. E era comum ouvir ao telefone: “Sabe Dra., a pandemia, né, a gente tá brigando muito.”
Sabe-se, por meio de muitas pesquisas empíricas, que ter um relacionamento amoroso bem-sucedido confere 15 anos a mais de vida para os membros do casal. Além disso, favorece a saúde, a resiliência e os filhos prosperam. Portanto, não só torna as pessoas mais saudáveis e mais ricas, como também é o segredo da longevidade.
Este texto então é para ajudá-los a melhorar a vida desses casais, sendo você terapeuta de casais ou não, entendendo que casais aqui é qualquer par que esteja se relacionando.
Quero apresentá-los a uma dupla de psicólogos pesquisadores que eu tive prazer de conhecer em um treinamento que fiz nos EUA e que me fizeram ficar apaixonada pela terapia de casal: John e Julie Gottman.
Tudo começou nos anos 70, quando os amigos Robert Levenson e John Gottman começaram a pesquisar como as pessoas se relacionavam. Diz a lenda que era para eles mesmos conseguirem ter bons relacionamentos também. Naquela época, havia muito livros sobre relacionamentos, mas quase nenhuma pesquisa relevante ou séria sobre o assunto. Em 1986, John Gottman e colegas montaram um Love Lab na Universidade de Indiana. Imaginem um Big Brother com casais recrutados para “viver” 24h sendo sistematicamente observados por pesquisadores. A instrução era: passem seus dias como se estivessem em suas casas. Seria exatamente como se estivessem em casa, exceto pelas medidas aferidas ao longo do dia e por terem que conversar sobre um assunto que adoravam e outro que fosse problemático. Para analisar a resposta imunológica ao nível de estresse foram utilizadas amostras de sangue e de urina, temperatura corporal, holters, câmeras etc.
O curioso é que Robert e John não haviam feito nada além de publicar os dados da pesquisa quando Julie, já casada com John, propôs usar a pesquisa para ajudar as pessoas a transformar seus relacionamentos uma vez que eles sabiam o que funciona ou não numa relação saudável.
De lá para cá, foram milhares de casais pesquisados em diferentes fases da vida, de recém-casados a aposentados, tendo o cuidado de incluir casais em situação de pobreza e do mesmo sexo. Foram 40 anos de pesquisas inovadoras sobre estabilidade conjugal e previsão de divórcio. Os dados acumulados foram conectados a ensinamentos práticos sobre resolução de conflitos, criação de conexões e sua percepção da existência dos casais Master e Disasters. Chamaram de Masters aqueles casais que permaneciam juntos e se consideravam felizes e que, quando brigavam, tinham cinco interações positivas para cada interação negativa, e de Disasters aqueles que se separavam ou viviam infelizes por longos anos sem conexão emocional.
E existem tipos de comunicação que acabam com qualquer felicidade. São: a crítica, a atitude defensiva, o desprezo e o desdém ou recusa em se comunicar, que foram apelidadas pelo autor carinhosamente como Cavaleiros do Apocalipse. Para quem não está familiarizado com os ensinamentos bíblicos, esses cavaleiros são aqueles que trazem peste, guerra, fome e morte.
Vamos começar com a crítica. Crítica é descrever uma falha na personalidade do cônjuge. Em vez de falar “Sinto-me chateado(a) com o fato de que a louça ficou suja ontem. Preciso da sua ajuda hoje para lavá-la”, a pessoa já inicia com “Você é tão preguiçoso(a). Toda vez que eu chego em casa a louça está suja”. Você, terapeuta, pode perceber isso rapidamente ao detectar “você sempre” ou “você nunca” na fala do cliente. A crítica descreve a falha de caráter do(a) parceiro(a) e não a situação.
Para se afastarem de um ataque percebido, as pessoas tendem a reagir, se proteger, defender sua inocência. Às vezes reagem contra-atacando ou devolvendo a culpa fazendo-se de vítima. Vamos voltar no exemplo da louça suja “Toda vez é isso, eu nunca sou bom(boa) o suficiente para você. Eu trabalho duro para pôr dinheiro nessa casa. Eu estou cansado(a), cansado(a), cansado(a)…”. Tudo ficaria mais fácil se o casal usasse este antídoto: aceitar a responsabilidade por pelo menos parte do problema. Exemplo: “Você tem razão. Ontem cheguei tão cansado(a) que não tive forças para lavar a louça, mas hoje faremos uma força-tarefa e tudo ficará limpo”.
Como desgraça pouca é bobagem, lá vem o desprezo. Desprezar alguém é colocar a pessoa para baixo, tomar um plano mais alto assumindo um nível moral mais elevado. Desprezo é qualquer declaração crítica que alguém faz quando se sente superior ao cônjuge. Exemplo: “sou melhor, mais inteligente, mais afetuoso(a), mais organizado(a), mais seguro(a), etc. que você”; ou ainda xingar, dar apelido, caçoar, imitar, rolar os olhos, cruzar os braços, bufar etc. Exemplo: “Tudo o que você me pede eu faço, só que eu não posso contar com você”. Melhor aqui é usar o antídoto: descrever os sentimentos e necessidades e criar uma cultura de apreciação. Exemplo: “Eu realmente fiquei chateada ontem, me senti desrespeitado(a) com a louça suja. Sei que você teve muito trabalho ontem. Podemos lavar tudo hoje?” Atenção: desprezo é o maior preditor de divórcio. Para mais exemplos de desprezo, acesse o vídeo do Terça Insana “Senhor Merda e Esposa”. Dê muita risada e veja o que não fazer numa relação.
Desdém ou recusa em se comunicar é quando o ouvinte se retira da interação, ficando, porém, no mesmo lugar. Basicamente a pessoa não dá dicas se está ouvindo, por exemplo, olhando para o lado, não mantendo contato ocular ou cruzando os braços. Antídoto: a pessoa procura se acalmar (usando exercícios) e ficar conectado com a interação. Diz que precisa de uma pausa e volta no tempo combinado. Quem estiver esperando não deve ir atrás, mandar mensagem, ou ligar e sim esperar o tempo estipulado. Se o parceiro(a) não voltar, deve dizer: “Nosso tempo estipulado já passou. Você precisa de mais quantos minutos?”.
O casal de pesquisadores afirma que interações cotidianas positivas são tanto a causa quanto os efeitos de relacionamentos felizes. São as pequenas coisas positivas feitas com frequência que fazem a diferença. Ao longo do tempo pequenas mudanças podem concretizar grandes transformações.
Momentos conflitantes são boas oportunidades para conhecer o outro, aproveite o período de reclusão social para ajudar seus clientes a promover conexão emocional. Praticando as dicas acima eles podem “sair da pandemia” mais próximos, discutirão menos e por consequência se sentirão mais satisfeitos com o relacionamento.
Referências:
10 Principles for Doing Effective Couples (2015). Julie Schwartz Gottman e John M. Gottman. Editora W.W. Norton § Company.
Eight Dates: Essential Conversations for a Lifetime of Love (2019). Julie Schwartz Gottman e John M. Gottman. Editora Workman Publishing Company.
Carolina Perroni
Psicóloga Analista do Comportamento, Mestre em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento pela Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Supervisora dos residentes em Psiquiatria do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Atende casais e adultos.