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Análise do Comportamento Clínica como iniciar consultório Sem categoria

Além do básico

por Lidianne Queiroz

Você se preparou, estudou, fez investimento em um espaço (virtual ou presencial) para atender. Após algum tempo, as primeiras clientes apareceram e tudo está acontecendo conforme você tinha planejado. Perfeito, agora me conta: Você realmente está sendo a melhor terapeuta para a sua cliente? Te pergunto isso porque, todos os passos que você realizou antes de começar a atender, me mostram que você realmente quer se orgulhar do que faz e gerar mudança na vida das pessoas que você atende.

E aqui vai o primeiro segredinho, nem só de conhecimento vive uma boa terapeuta. Tudo o que você faz ou não faz em relação à sua cliente, diz pra ela o quanto você está comprometida em conduzi-la a atravessar a ponte em direção a uma vida valorosa. Então, um detalhe que certamente não passa despercebido é a sua pontualidade. Ser pontual comunica para a sua cliente que você reservou um horário adequado para que ela seja atendida, que você se importa com o tempo dela e que está ali exclusivamente para ela. Organize sua agenda de atendimentos de modo que os horários tenham a menor sobreposição possível. Além da pontualidade um outro aspecto relevante é a transmissão da mensagem de que a cliente se encontra em um espaço seguro e sigiloso, especialmente se você está realizando atendimento virtual.

A segunda mensagem que você precisa deixar clara para a sua cliente é que você trabalha em concordância com o nosso Código de Ética e que vai muito além da confidencialidade da relação terapeuta-cliente. Deixe claro que você trabalha respeitando e promovendo a liberdade dela em escolher e tomar as próprias decisões. Mostre que o foco do seu trabalho é na promoção da saúde e na qualidade de vida dela. Se engaje em ações que reflitam (na sua clínica) o seu comprometimento no exercício da responsabilidade social no enfrentamento das injustiças e desigualdades. Esteja comprometida com a tarefa de universalizar as informações sobre o funcionamento do trabalho de uma terapeuta para que mais pessoas possam ter acesso ao serviço de psicologia. Divulgue amplamente a mensagem que você não compactua com contextos de opressão, exploração e violência. Esteja atenta à realidade política, social e econômica do país onde a sua cliente reside, é sua função analisar e compreender o contexto em que ela está inserida para ampliar a sua capacidade de suporte. Tenha sempre em mente que o seu aprimoramento contínuo é fundamental para que a qualidade do seu serviço seja mantida.

Outro tópico muito relevante é a documentação que diz respeito ao seu atendimento. Devem permanecer em constante atualização o prontuário e o registro de sessões da sua cliente. É corriqueiro que estes documentos sejam negligenciados ou até mesmo esquecidos. Entretanto, além de estar em conformidade com o Conselho de Psicologia, ter os registros atualizados te ajuda a manter a clareza sobre o caso que você está atendendo e sobre as estratégias e ferramentas que você está utilizando. Estes dois aspectos te ajudarão a não perder o foco no seu atendimento, possibilitando que você redirecione (caso seja necessário) a sua condução sobre o caso de maneira mais ágil. Uma consequência que é frequentemente observada em terapeutas que mantém seus registros atualizados é a disposição em se manter comprometida com a cliente. Isso é importante porque após um tempo de atendimento ambas podem sentir-se desmotivadas. E você pode pensar que não está fazendo um bom trabalho ou que não consegue “ajudar” a sua cliente. E tá tudo bem pensar assim, vez ou outra analisamos nosso desempenho e pode ser que apareçam resultados desagradáveis. O problema reside na falta de dados que possam refutar ou corroborar os seus pensamentos. Sem registros atualizados fica praticamente impossível saber se você realmente precisa rever sua condução do caso ou se está se auto sabotando. Além dos documentos atualizados, receber supervisão vai te proporcionar mais segurança e tranquilidade na sua atuação profissional.

E para finalizar, eu oriento que você busque desenvolver ou aprimorar suas habilidades de assertividade e de gestão de carreira. Na maioria das situações você é a “faz tudo” da sua clínica, e para prevenir que a sua empresa seja impedida de operar é fundamental saber lidar com questões administrativas e financeiras com a sua cliente. Deixar claro desde o começo e relembrar sempre que houver necessidade, os compromissos dela com horário, com o pagamento e com o período em que ela pretende tirar férias. Não aprendemos durante a graduação que iremos trabalhar com venda de serviços, eu sei que parece meio óbvio, mas não é o que eu tenho encontrado em minha prática como supervisora e consultora. Muitas terapeutas que chegam até mim apresentam dificuldade de falar sobre dinheiro, em precificar a sua sessão e cobrar de acordo com essa precificação. A consequência para comportamentos como estes é o acúmulo de clientes que pagam valores muito abaixo do necessário para manter a saúde financeira do seu negócio.

Apresentei aqui alguns pontos que entendo como tão relevantes quanto escolher um espaço de atendimento e decidir atuar como terapeuta clínica. A profissão de psicologia precisa ser encarada pelas psicólogas e pelas clientes como um negócio e como tal deve estar sujeita a todos os aspectos que envolvem o funcionamento saudável dessa firma. Nós, as terapeutas, podemos ser acolhedoras, gentis, compreensivas e mesmo assim atuar como empresárias da nossa clínica quando necessário.

Nota da autora: se você quer saber mais sobre como gerenciar seu consultório, me chama pra conversar no Instagram @liddiqueiroz.

Referências

Abreu-Rodrigues, J. & Ribeiro, M. R. (2005). Análise do comportamento: pesquisa, teoria e aplicação. Porto Alegre, RS: Artmed.

Moreira, M.B. & Medeiros, C. A (2007). Princípios básicos de análise do comportamento. Porto Alegre: Artmed

Aureliano, L., & Pessoa, C. V. B. B. (2017). Análise de Sistemas Comportamentais: uma proposta de análise e intervenção nas organizações. In Vilas Boas, D. L. O.,

Borba, A., Ramos, C. C., & Ramos, T. D. (2017). O surgimento da Análise do Comportamento Aplicada às Organizações. In Vilas Boas, D. L. O., Cassas, F., Gusso, H. L. (Orgs.). Comportamento em Foco (Vol. 5, Cap. 1, pp. 13-27). São Paulo: Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental. 

Gusso, G. L. (2017). Desafios ao Analista do Comportamento no Campo Organizacional Brasileiro. In Vilas Boas, D. L. O., Cassas, F., Gusso, H. L. (Orgs.). Comportamento em Foco (Vol. 5, Cap. 6, pp. 77-86). São Paulo: Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental.  Skinner, B. F. (2003). Ciência e comportamento humano. (Trad. João Carlos Todorov) São Paulo: Martins Fontes. (Original publicado em 1953).

Dra. em Teoria e Pesquisa do Comportamento, Empreendedora, Psicóloga, Terapeuta Contextual pelo Instituto Florescer, Consultora em Gestão Comportamental pela Realize CST, Supervisora Sênior de Equipe pela Flamboiã ABA, Consultora em plataforma digital para saúde mental

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Análise do Comportamento Clínica resiliência Sem categoria

É possível ensinar resiliência?

por Tatiana Cohab Khafif

Nas últimas décadas, a renomada pesquisadora da Universidade de Stanford, Angela Duckworth, tem buscado compreender o que faz com que indivíduos com níveis similares de inteligência, sejam capazes de realizar maiores ou menores conquistas em suas vidas. Duckworth notou que, apesar de certas características serem cruciais para o sucesso em determinadas profissões (como por exemplo a extroversão, para vendas), indivíduos bem sucedidos tem algo em comum: eles possuem grit (Duckworth, 2007). O termo grit, do inglês, é definido como a capacidade trabalhar com perseverança e paixão visando objetivos a longo prazo; assim, ter grit envolve ser capaz de enfrentar os desafios e percalços do caminho, mantendo o esforço e o interesse constantes, apesar dos fracassos e adversidades (Duckworth, 2007).

Apesar de certamente distinta, a definição de grit nos faz lembrar, em muitos aspectos, a de resiliência, tema de grande enfoque no contexto clínico e do desenvolvimento. O que faz com que certos indivíduos prevaleçam frente a adversidades, enquanto outros sucumbem a eles? É possível ensinar resiliência e grit, ou devemos nos conformar com o que nos é dado?

            Estudos mostram que apesar de sofrer certa influência genética (Rimfield, 2016), grit e resiliência podem ser alterados e impactados por fatores ambientais (Boneva, 2019). Quando falamos de ambiente, sabemos que este pode oferecer fatores de risco e fatores protetores. Os fatores ambientais protetores, tem como função o amortecimento do impacto dos fatores de risco, os quais muitas vezes estão fora do nosso controle (Zamignani, 2017).

            A autonomia, o autocontrole, a consciência interpessoal, a empatia, habilidade de soluções de problema, enfrentamento e planejamento, são essenciais para o desenvolvimento de um indivíduo resiliente (Zamignani, 2017).  Mas como nós, pais, psicólogos e educadores podemos contribuir para o desenvolvimento de um repertório adequado para o desenvolvimento de grit e da resiliência?

            Para além dos cuidados físicos e da estimulação adequada, é importante que haja um enfoque no desenvolvimento da linguagem e da expressão emocional, que permitirá que o indivíduo seja capaz de fazer escolhas, dialogar, argumentar em prol de suas necessidades, assim como expressar-se de forma adequada (Zamignani, 2017). Para tal, é necessário que haja uma consistência no afeto e nos limites dados ao indivíduo. É muito comum que haja confusão entre uma implementação clara e sólida de limites, com regras consistentes e instruções claras, e a punição, onde é lançada mão de ameaças e de um não constante para visando a obediência e o respeito às regras.

A psicóloga clínica e pesquisadora, Diana Baumrind propôs, na década de 1960, um modelo teórico sobre tipos de controle parental, que pode ser utilizado para pautar diferentes relações de cuidado. Dentro do modelo proposto por Baumrind, quatro principais estilos parentais (ou maneiras de educar) são analisados, sendo eles, os estilos autoritativo, autoritário, permissivo e o negligente. Dentro do estilo autoritativo, estariam os pais com alta exigência, e ao mesmo tempo alta responsividade (apoio emocional, atenção para as necessidades do indivíduo, orientação); dentro do autoritário, estariam os pais com alta exigência, porém baixa responsividade; no permissivo, teríamos cuidadores com baixa exigência e alta responsividade; e no negligente, pais com baixa exigência e baixa responsividade (Baumrind, 1966).

É claro que, quanto antes forem implementados estes cuidados, mais fácil será o desenvolvimento de características favoráveis ao grit e a resiliência; mas isso não significa que não podemos olhar para estes aspectos mais adiante na vida, em diferentes contextos. Como psicólogos clínicos, cuidadores e educadores, temos a oportunidade de olhar para os indivíduos que nos elegem para guiá-los em seus processos únicos e tão individuais de auto-conhecimento, sob uma lente de cuidado e de estabelecimento de limites, que lhes dê a segurança, o amparo, e ao mesmo tempo a autonomia e autoconfiança para se desenvolverem como indivíduos flexíveis e resilientes.

REFERÊNCIAS:

Alan, S., Boneva, T., & Ertac, S. (2019). Ever failed, try again, succeed better: Results from a randomized educational intervention on grit. Quarterly Journal of Economics, 134, 1121–1162.

Baumrind, D. (1966). Effects of authoritative control on child behavior. Child Development, 37, 887-907.

Duckworth, A.L.; Peterson, C.; Matthews, M.D.; Kelly, D. R. (2007). Grit: perseverance and passion for long-term goals. Journal of personality and social psychology, 92(6), 1087. DOI: https://doi.org/10.1037/0022-3514.92.6.1087

Park, D. T.; Sukayama, E.; Yu, A.; Duckworth, A.L. (2020). The development of grit and growth mindset during adolescence. Journal of Experimental Child Psychology, 198. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jecp.2020.104889

Rimfeld, K., Kovas, Y., Dale, P. S., & Plomin, R. (2016). True grit and genetics: Predicting academic achievement from personality. Journal of Personality and Social Psychology, 111, 780–789. DOI: https://doi.org/10.1037/pspp0000089  Zamignani, D. R. (2017). Parentalização para a Resiliência. Video online. Youtube, 21 de Abril de 2017. Evolucio Capacitação Profissional. Conteúdo online, acessado em 10 de maio de 2021: https://www.youtube.com/channel/UCqGyJ4IppEO7adcFf3fJMng

Psicóloga graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2018). Mestranda (término Junho 2021), psicóloga colaboradora e pesquisadora do Ambulatório de Transtorno do Humor Bipolar (PROMAN) no IPq HC-FMUSP. Analista do comportamento, atualmente cursando especialização em Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) (FATEC-PR, término 2022). Atua clinicamente com crianças, adolescentes e adultos, e tem experiência com transtornos do humor e transtornos de ansiedade.

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Análise do Comportamento Clínica frustração Relações humanas

Frustração: você sabe lidar?

por Bruna Catarina Pavani

Por diversas vezes abri o documento do word esperando conseguir escrever algo bacana. Tentei buscar inspirações em outros textos que escrevi, em textos que li, em podcasts que ouvi, mas nada vinha.

Em alguns momentos, meu pensamento era: ‘’ está tudo bem, daqui a pouco eu tento de novo’’, em outros: ‘’eu preciso escrever isso agora’’. Penso que, o sentimento que consegue resumir bem tudo isso é: a frustração!

Há alguns anos atrás participei de uma palestra cujo o nome era: ‘’você só saberá lidar com a frustração se frustrando’’. Hoje essa palestra fez todo sentido. Durante a palestra, o palestrante comentou que por mais que existem diversos livros de autoajuda que falem sobre o tema, não existe um manual de instrução que nos ensine a não nos frustrarmos mais.


       Frustrações fazem parte da nossa vida e só vamos aprender a lidar com elas quando estamos expostos a essas situações.


       Não temos como nos preparar para uma situação para que quando ela aconteça, sintamos menos… por mais que você se prepare para lidar com a dor de uma injeção, você vai continuar sentindo a dor quando ela for aplicada e essa dor passa!

Aceitar o que estamos sentindo é fundamental para situações assim… a questão, é que somos ensinados a nos esquivar de nossos sentimentos!

Hayes e Pistorello (2015) mencionam:

Aceitar um evento encoberto é estar disposto a tê-lo, é possibilitar sua manifestação e não evitar entrar em contato com ele. Não é o mesmo que resignação, tomá-lo como uma certeza ou com tolerância, mas perceber o que está acontecendo com seus pensamentos e sentimentos sem perder de vista que são apenas pensamentos e sentimentos, sem se fundir a eles. (…) Aceitar os eventos encobertos tem duas grandes vantagens: o autoconhecimento — saber o que se passa consigo mesmo e como os acontecimentos repercutem nos pensamentos e sentimentos, possibilitando o acesso à experiência e consequentemente aprendendo através dela; e a neutralização da necessidade de fugir ou evitar estes eventos (p.69)

No próximo texto, falarei mais pra vocês sobre como aceitar nossos sentimentos! Hayes, S.C. e Pistorello, J. (2015). Introdução a Terapia de Aceitação e Compromisso. Belo Horizonte/MG: Artesã. P.69

Bruna Catarina Pavani – @psicobrupavani

Especialista em Análise do comportamento (ITCR) | Pós graduanda em Sexologia (INPASEX)
CRP 06/135021

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Análise do Comportamento Clínica drogas psicoterapia assistida por psicodélicos Sem categoria

Tabu: consumo de substâncias psicoativas – com Pedro Quaresma

por Canal dos Berrekas

Fruto do reforçador de vocês, nasce uma nova parceria BerrekasCAST feat DíadeLab. Apertem os cintos que já começaremos com os dois pés na porta com um tema que veio para romper a “quarta parede”. O nosso convidado de hoje é o Pedro Quaresma, nosso comentarista oficial diretamente da DíadeLab, que veio para falar sobre os estudos envolvendo abuso de substâncias, uso medicinal de substâncias ainda consideradas ilegais em nosso país e as consequências dessa prática. O gran finale será sobre Psicoterapia Assistida por Psicodélicos.

Se você procura conteúdos sobre Psicologia em geral com ênfase na Análise do Comportamento seu lugar é aqui. Aperte os cintos e aproveite a jornada oferecida pelos Berrekas em parceria com a DíadeLAB. Serão episódios recheados de bom humor, conhecimento científico, análise do comportamento e sugestões de toda a galera que curte escutar um podcast em qualquer hora do dia.

Sobre @canaldosberrekas

Canal criado por dois Psicólogos Comportamentais, com o intuito tanto de divulgar os trabalhos da Psicologia Comportamental quanto a Psicologia em geral e seu contato com as outras profissões. Obrigado e esperamos que gostem. Um abraço dos BERREKAS!!!

Luciano Martorelli Moreno CRP 06/149510 @psi.lucianomartorelli Lucas Vinicius Ferreira da Silva CRP 06/166176 @psi.lucasviniciusf

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Análise do Comportamento Clínica Relações humanas

A importância da intermitência nos relacionamentos amorosos.

Bruna C. Pavani

De acordo com Martin e Pear (2009), uma dada classe de respostas pode ser reforçada em esquema de reforçamento contínuo – quando o reforço é produzido toda vez que o comportamento é emitido – ou intermitente – quando o comportamento ora é reforçado, ora não. Boa parte do nosso comportamento no cotidiano é reforçado intermitentemente; por exemplo, você só recebe seu salário quando trabalha por determinados dias e não depois de cada comportamento emitido no trabalho.

Tendo isso em vista, vamos imaginar duas situações:

João namora com Maria e Maurício namora com Cláudia.

Todos os dias João leva flores a Maria, já Maurício, leva de vez em quando flores a Cláudia.

Em um determinado dia, João se esqueceu de levar flores a Maria e Maria brigou com João. Mas como Maurício não leva sempre flores a Cláudia, quando ele leva, Cláudia se surpreende.

Agora, vamos fazer uma análise funcional disso:

Tabela 1. Relacionamento de João e Maria:

Resposta de MariaConsequênciaFunção da consequência para MariaAções de Maria
Aproximar-se de JoãoJoão leva flores  . Evidência de afeto (Maria sente-se amada SR+);
. Diminuição de eventual privação afetiva (SR-).
. Maria se comporta em função da apresentação do reforçador;
. Manutenção da relação em esquema de reforçamento contínuo.
Aproximar-se de JoãoJoão esquece de levar as flores. Retirada da evidência de afeto (Extinção);
. Como o esquema é de reforçamento contínuo, a experiência de Maria é de retirada do reforçador (seu comportamento de aproximar-se de João não foi reforçado com flores nessa ocasião.
. Maria se comporta em função da retirada do que era reforçador a ela;
. Brigas ocasionais Questionamentos sobre o relacionamento Afastamento de Maria em médio prazo.
Sr+ = Reforço positivo; Sr- = Reforço negativo; P+= Punição positiva; P-= Punição Negativa

Tabela 2. Relacionamento Maurício e Cláudia:

Resposta de CláudiaAntecedentesFunção para CláudiaAções de Cláudia
Aproximar-se de MaurícioMaurício encontra Cláudia e apresenta demonstrações de afeto variadas.  . As ações diversas de Maurício provêem evidências de afeto;
. Diminuição de eventual privação afetiva de ambos (Sr-) 
. Por se tratar de um esquema de reforçamento intermitente, a ausência das flores, não é vivida como “retirada” de algo.  
. Cláudia se comporta em função da apresentação dos reforçadores.  
Aproximar-se de MaurícioNa presença da namorada, Maurício leva flores em momentos inesperados.  . Cláudia “se surpreende” quando recebe as flores (Sr+ – por ser um evento pouco frequente, a apresentação das flores é vivida como “novidade”, e encontro é somado ao evento “receber flores”.). Cláudia se comporta em função do que Maurício adiciona ao relacionamento;
. A apresentação das flores contribui para a manutenção do comportamento em esquema de reforço intermitente.
Sr+ = Reforço positivo; Sr- = Reforço negativo

João reforçava continuamente o comportamento de Maria ao vê-la, levando flores. Quando ele deixou de levar a flor, Maria estranhou e discutiu com ele, pois este não era um comportamento esperado de João. A retirada do reforçador em um esquema de reforçamento contínuo estabelece uma condição de extinção – nesse caso, o comportamento de Maria de se aproximar de João é que deixa de ser reforçado com flores. E é aí que está a diferença entre as duas situações… quando o comportamento é reforçado continuamente, ele é menos resistente à extinção e, logo que o reforço é retirado, já fica evidente a falta do reforçador e a “falha” no esquema.

Cláudia, por sua vez, como Maurício lhe levava flores apenas eventualmente, aprendeu a esperar pelo reforçamento – ou seja, seu comportamento se tornou mais resistente à extinção. Assim, na ausência do reforço não há conflitos em seu relacionamento, pois a “novidade” na situação é a apresentação do reforçador, e não a sua retirada. Isso se dá porque Cláudia está exposta a um esquema de reforçamento intermitente.

Podemos pensar em outros reforçadores existentes nas relações amorosas, que, quando deixam de existir, ou diminuem de frequência, podem causar atritos, tais como: ligações, mensagens, presentes etc. Troquem as flores desse exemplo por responder mensagens, por exemplo… se você costuma responder imediatamente em toda ocasião, estabelece um padrão de reforçamento contínuo. Dessa forma, a partir do momento que você não responde imediatamente, isso pode gerar um atrito. Por outro lado, se de vez em quando você responde rápido e de vez em quando não, a pessoa já espera isso de você.

É comum que essas mudanças no esquema de reforçamento ocorram gradativamente. No início de uma relação, a novidade é uma operação motivadora (OM – aquela que, momentaneamente, altera a efetividade reforçadora de um estímulo) poderosa e, movidos por essa operação motivadora, tendemos a dar atenção ao parceiro em esquema quase contínuo. Com o tempo de convivência uma nova operação motivadora começa a agir, que é a estabilidade na relação de afeto, ao mesmo tempo que a OM “novidade” começa a diminuir. Em função dessas mudanças, tendemos a confiar na relação de afeto, e temos menos necessidade de responder continuamente. Essa mudança pode ser sentida por alguns como ameaçadora, gerando insegurança, cobranças e brigas. Se essas mudanças se estabelecem de maneira abrupta, o conflito é quase certo.

Para quem trabalha com casais ou mesmo quando se discutem relações amorosas na psicoterapia individual, pensar sobre o impacto desse esquemas de reforçamento sobre o relacionamento é fundamental.

Martin, G. e Pear, J. (2009). Modificação de comportamento. O que é e como fazer. Trad. Noreen Campbell de Aguirre; revisão cientifica Hélio José Guilhardi. São Paulo: Roca. 8° ed. pp. 89